Sobrecarga atrial esquerda no eletrocardiograma
A passagem do estímulo elétrico pelos átrios é refletida no eletrocardiograma como a onda P.
A onda P normal mede menos de 2.5 mm de altura e menos de 0.12 s de duração (3 quadrados pequenos).
Além disso, ela é composta por dois componentes, um componente inicial no qual se observa a despolarização do átrio direito e um componente final que resulta da despolarização do átrio esquerdo.
Essa diferença é mais marcante na derivação V1, onde a onda P tem uma morfologia bifásica, com uma primeira parte positiva (átrio direito) e uma segunda parte negativa (átrio esquerdo) 1.
Sobrecarga atrial esquerda no ECG
Como se deve supor, a dilatação do átrio esquerdo produz, na maioria dos casos, mudanças na onda P, especialmente em seu componente final.
Como o átrio esquerdo despolariza-se após o átrio direito, um crescimento atrial esquerdo resultará em uma duração maior do tempo de despolarização e, portanto, em um alargamento da onda P, que ficará maior que 0,12 s.
Às vezes, os componentes direito e esquerdo da onda P são ligeiramente separados, dando à onda P uma forma de letra "m" minúscula, classicamente chamada onda P mitrale.
Sobrecarga atrial esquerda:
Onda P maior que 0,12 s com forma da letra m (seta vermelha).
Além disso, na derivação V1, a profundidade do componente final negativo é maior que a altura da parte inicial.
Em resumo: O sinal mais notável da sobrecarga atrial esquerda é uma onda P larga, maior que 0,12 s ou 3 quadrados pequenos, com predomínio da parte final negativa na derivação V1.
Sobrecarga atrial esquerda:
Onda P larga com a parte negativa mais larga e mais profunda.
É importante salientar que, em pacientes com cardiopatia isquêmica, podem ser observadas ondas P amplas com átrio esquerdo de dimensões normais, provavelmente devido a uma lentificação da condução atrial.
A presença de sinais eletrocardiográficos de dilatação do átrio esquerdo é um dos critérios para o diagnóstico de hipertrofia ventricular esquerda (HVE), sendo ainda um dos poucos sinais de HVE detectáveis no ECG em pacientes com bloqueio completo do ramo direito (veija hipertrofia ventricular esquerda).
Causas de sobrecarga atrial esquerda
O envelhecimento por si só causa o crescimento do átrio esquerdo, provavelmente em razão das alterações estruturais do tecido atrial.
A obesidade também tem sido relacionada à dilatação do átrio esquerdo, embora o mecanismo não seja muito claro 2.
A hipertrofia ventricular esquerda está claramente relacionada à dilatação do átrio esquerdo, de modo que as condições causadoras de HVE, como hipertensão, estenose aórtica ou cardiomiopatia hipertrófica, podem gerar o crescimento do átrio esquerdo 2 3.
As alterações da valva mitral são as causas clássicas de dilatação do átrio esquerdo, tanto a estenose mitral, devido ao aumento da pressão, como a insuficiência mitral, devido ao aumento de volume.
A insuficiência aórtica gera sobrecarga das cavidades esquerdas, propiciando a dilatação do átrio esquerdo e do ventrículo esquerdo.
A fibrilação atrial é causa e consequência da dilatação do átrio esquerdo, embora a presença de FA no ECG prejudique a determinação dos sinais de crescimento atrial, porque não há onda P 4.
Causas da sobrecarga do átrio esquerdo
Dilatação atrial esquerda e bloqueio interatrial
Artigo relacionado: Síndrome de Bayés e os bloqueios interatriais.
O padrão de bloqueio interatrial apresenta um alargamento da onda P que é frequentemente bimodal, o que muitas vezes leva à interpretação como dilatação atrial esquerda, mas esses dois padrões eletrocardiográficos são entidades diferentes 5.
Nesses casos, é a morfologia da onda P na derivação V1 que nos permite determinar se há um crescimento atrial esquerdo associado ao bloqueio interatrial.
A presença de um componente final negativo da onda P na derivação V1 maior que 40 ms favorece o diagnóstico de dilatação atrial esquerda 5.
Em qualquer caso, a associação entre o bloqueio interatrial e a dilatação atrial esquerda é relativamente frequente. De fato, considerou-se que a onda P bimodal é melhor explicada pelo bloqueio interatrial subjacente do que pela distância que o impulso tem que atravessar 6.
Mais informações em: Síndrome de Bayés e os bloqueios interatriais.
Referências
- 1. Surawicz B, Knilans TK. Chou’s electrocardiography in clinical practice, 6th ed. Philadelphia: Elservier; 2008.
- 2. Edhouse J, Thakur RK, Khalil JM. Conditions affecting the left side of the heart. BMJ 2002;324:1264. doi: 10.1136/bmj.324.7348.1264.
- 3. Vaziri SM, Larson MG, Lauer MS, et al. Influence of Blood Pressure on Left Atrial Size. The Framingham Heart Study. Hypertension. 1995; 25: 1155-1160. doi: 10.1161/01.hyp.25.6.1155.
- 4. Bombelli M, Facchetti R, Cuspidi C et al. Prognostic Significance of Left Atrial Enlargement in a General Population. Results of the PAMELA Study. Hypertension. 2014; 64: 1205-1211. doi: 10.1161/HYPERTENSIONAHA.114.03975.
- 5. Bayés de Luna A, Platonov P, et al. Interatrial blocks. A separate entity from left atrial enlargement: a consensus report. J Electrocardiol. 2012 Sep;45(5):445-51. doi: 10.1016/j.jelectrocard.2012.06.029.
- 6. Diego Conde D, Seoane L, et al. Bayés’syndrome: the association between interatrial block and supraventricular arrhythmias. Expert Rev. Cardiovasc. Ther. 13(5), 541–550 (2015). doi: 10.1586/14779072.2015.1037283.
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